Crônicas da criação VI e VII
Chegamos finalmente ao sétimo
dia. Olha que dá até pra descansar um pouco. Mafalda e Naum estão realmente se
entendendo, ao estilo dos gatos.
Já o povo, muito religioso,
vem todo dia ler as crônicas e me cobra quando vai sair a próxima. Reclamam que
tinham que ser sete, pra ficar igual à Bíblia, se não dá azar. O que é uma
heresia, né, gente? Uns profetizam que a história terá um final feliz. Outros
perguntam como é que eu vou fazer quando eles tiverem filhotes. Olha procevê: conseguem
pensar nisso. Não querem que eu descanse.
Pois vou dizer uma coisa. Me
contento com um final feliz ao fim do dia. Mafalda e Naum já conseguem sentir o
cheiro do outro pela casa, podem se olhar e passear pelos cômodos sem a minha
sombra. Até conseguem se tocar em alguma brincadeira. Não posso dizer que não
há estresse. Mas quase vejo a paz.
A bem da verdade, acho que sou
eu a mais estressada. Porque é assim, ó: preciso deixar que eles sejam felinos e
(o desejo é meu) em boa convivência. Comigo, isso acontece fácil. Cada um me
aceita como dona da casa. E um segredinho: falo que sou mãe deles, e eles até correspondem.
Agora, o desafio está em que convivam uma com o outro, sem se trucidarem. Posso
mediar às vezes, quando reconhecem minha presença, só não consigo impor que
façam o que quero. Diz o google que, se o negócio esquentar, eles nem conseguem
me ver. É desse jeito.
Hoje saí de casa. Pela
primeira vez os gatinhos ficaram ao Deus dará. Dará graça a mim para suportar
não estar no controle e deixá-los aprenderem a serem gatos, o tanto que é
possível. Há disputas de território, falta de limites nas brincadeiras. Dona
Mafalda gosta de um joguinho de poder e nem enxerga sua potencial violência. Eles
são gata e gato.
Decidi acompanhar à
distância, ocupando o meu lugar, mediando situações que nem percebem e outras
em que admitem minha presença, sempre deixando que descubram seus espaços possíveis
e necessários. Isso inclui o risco de não se entenderem.
Mas, me relacionando com uma
e outro agora, acredito que vai dar certo. Mafalda anda doida pra pegar o
bichinho, a bem da verdade. Parece reativa, mas só quer brincar, do jeito dela.
E o Naum é um fofo, vai atrás das brincadeiras da gata, não sabendo o perigo
que corre. Ou não. Vai saber o que pensa um novo felino. É preciso deixá-los se
entenderem
É assim. Foi-se a tarde e a
manhã o sexto dia. E no sétimo (e já é oitavo e fiquei com preguiça de escrever
ontem), ainda espero o verdadeiro descanso. Naum, como diz o nome, é um consolo,
sim. Veio em boa hora. Gracinha. A Mafalda, acolho e amo do jeito que é. Tudo
bem que errei em escolher o nome. Ela é do combate, mesmo.
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