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Mostrando postagens de 2016

Para falar em Nelson Rodrigues

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PARA falar em Nelson Rodrigues Concluí a leitura de "O Casamento” [1] . Sei que Nelson é leitura difícil e incomodativa para muitos. Não é em vão o nome que Rui Castro deu à biografia desse polêmico autor: O anjo pornográfico. Tirando os exageros rodrigueanos (que não atendem ao meu gosto pessoal), há que se considerar a sagacidade do escritor em expor as hipocrisias humanas. Ele fala do que a contece em todas as sociedades e famílias, sem dó, a vida como ela é . Talvez por isso mesmo choque alguns. A meu ver, mais do que pornográfico, é trágico. Mostra a sordidez que todos os humanos são capazes de vivenciar e de que em algum momento também se tornam vítimas. O livro relata acontecimentos das quarenta e oito horas que antecedem o casamento da filha mais nova do Dr. Sabino. Nesse curto período são citados casos de incesto, adultério, alcoolismo, drogas, homofobia, estupro etc. O livro é realmente nauseante. Mas provoca permanente reflexão sobre as relações humanas.

Aquarius

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Setembro trouxe a estreia do filme Aquarius em todo o Brasil. É uma produção franco-brasileira, do diretor Kleber Mendonça Filho, estrelado por Sônia Braga e um time significativo de artistas nacionais. Disputou a Palma de Ouro em Cannes e foi hors concours no Festival de Cinema de Gramado, onde Sônia Braga recebeu merecida homenagem pelo conjunto de seu trabalho cinematográfico. Além disso, concorre para representar o Brasil no Oscar, na categoria de filme estrangeiro. O filme foi alvo de polêmicas políticas que correram mundo em relação ao impeachment de Dilma Rousseff, quando, no Festival de Cannes, em maio último, a equipe subiu ao palco com cartazes contra o afastamento da ex-presidenta. Além disso, gerou discussões na mídia por conta da idade de classificação do filme, 18 anos, revertida para 16 antes da estreia em circuito nacional. Polêmicas midiáticas à parte, o filme é rico em beleza. Não só de Sônia Braga, atraente e de grande presença aos 66 anos. A personagem

Das Primeiras Estórias

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Guimarães Rosa é normalmente indicado como ligado a uma vertente literária regionalista . Isso pode ser um reducionismo. Rosa explorou, sim, densamente o sertão mineiro em sua obra, descendo a minúcias das descrições geográficas, o estilo de vida, a linguagem, a visão de mundo do sertanejo etc. Mas nesse mundo localizado, conseguiu extrair o que a vida e o humano têm de mais universal. Primeiras estórias (1962) traz 21 contos que se situam nos limites do real e do irreal, no fascínio pelo alógico. Estórias em contraposição a histórias – ou seja, narrativas curtas, ficcionais. Diversos assuntos, diversas situações e problemas, diversos tons de narrativa, variedade de construções e ritmos. Há estórias que inauguram lírica e ironicamente o inesperado, como a de uma vaca fugitiva que retorna a sua fazenda de origem ( Sequencia ). Decidido a resgatá-la, um vaqueiro persegue-a com incomum persistência. Ao chegar à fazenda para onde a vaca retornara, descobre que havia outro moti

Poesia de Rio

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Este é o primeiro CD de Clauber Ramos. As composições são dele mesmo, e os arranjos, direção e produção, de João Alexandre, que também canta em uma das músicas. Há ainda a parceria de Jorge Camargo numa das composições e interpretando outra canção do álbum. Além desses músicos importantes, o trabalho traz outras participações destacáveis: Adriano Reis, Daniel Costa Romanetto, Heber Souza, Felipe Silveira, Osmário Marinho, Beto Correa, e o vocal de Adriana Simões, Isabela Maris, Ellen Souza e José Barbosa Junior na primeira canção do CD. Traz ainda um belo projeto gráfico e ilustrações de Anderson Monteiro. “Poesia de Rio”, canção-título, como o próprio Clauber diz, “foi composta tendo em mente um barco que depois de navegar desde a nascente até grande parte de um rio, olha, traz e repensa a jornada [...] Tudo isso é na verdade metáfora para falar da vida...” Pois esta é a temática do álbum. Não é nova, nem é nova a metáfora. Metaforizar a vida como um rio é recorrente na

O direito de escolher a própria vida ou que língua, hein?!

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Li recentemente uma matéria do El País sobre uma jornalista americana que publicou um livro, fenômeno de venda nos EUA: Solteirona, o Direito de Escolher a Própria Vida  ( Spinster: Making a Life of One's Own , no título original em inglês). Trata-se de um ensaio que é um mix de relato de experiência com dados sobre o tema. Kate Bolick parece não temer o rótulo pejorativo e o assume com orgulho. Muitas matérias na mídia nacional dos últimos tempos me fizeram pensar sobre a condição da mulher na nossa sociedade ainda hoje: além dos comentários sobre o livro da jornalista, o recente caso de barbárie ocorrida com uma jovem no Rio de Janeiro; as mais diferentes observações sobre a atual primeira dama do Planalto; a nova propaganda de beleza da Natura; as recém-lançadas Barbies, que contemplam diferentes modelos corporais etc. A verdade é que, em pleno século XXI, com tantos discursos progressistas sobre a questão de gênero, percebo que a mulher é ainda vítima de um olhar não

Nise: o coração da leitura

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Em muitas salas de exibição pelo país afora, o filme “Nise: o coração da loucura” está em cartaz, uma homenagem cinematográfica à Dra. Nise da Silveira, promotora de uma nova forma de tratamento aos pacientes de esquizofrenia no Brasil, abrindo mão dos tratamentos tradicionais de eletrochoque e lobotomia. O filme é encenado por Glória Pires no papel principal, com direção de Roberto Berliner. Conta ainda com a presença de Simone Mazzer, Julio Adrião, Claudio Jaborandy, Fabrício Boliveira, Roney Villela, Flavio Bauraqui, Bernardo Marinho, Augusto Madeira, Felipe Rocha, Roberta Rodrigues, Georgiana Góes, Fernando Eiras, Charles Fricks e mais. F oi exibido no ano passado no Festival do Rio e no Festival Internacional de Tóquio, quando ganhou os prêmios de melhor filme e melhor atriz para Glória Pires. É emocionante, pela qualidade da produção cinematográfica, mas também por popularizar o trabalho de Nise, primeira mulher brasileira a se formar em Medicina, além de presa política