Hoje acordei sem máscaras. Posso. Estou em
casa. E minhas máscaras estão contaminadas, como a de todas e todos. Máscaras
sujas se lavam em casa, não é mesmo? Ando adoecida pelo meu país, como um todo,
como todas e todos. Deu ruim. Erramos, todas e todos. Eu errei. Fiz escolhas
equivocadas e deixei que outras e outros me impusessem as suas. Precisamos de
meia volta, todas e todos, sem militarismos, volver, sim, à sanidade, à
civilidade. Todas e todos. De todas as etnias, de todas as tribos, de direita,
de centro, de esquerda, de cima, de baixo. Mas quem está em baixo sente mais a
queda de todos. Uso as marcações de gênero no texto daqui pra frente apenas no
masculino. Não porque as mulheres não errem, mas porque nossa raiz menos humana
assume uma voz de homem. Cristãos e ateus, acadêmicos e não acadêmicos, teólogos e leigos, estamos com o dedo em riste, cheios de julgamentos.
Quem está há mais tempo na história, quem chegou agora. Todos se acham no
direito de pensar os desfechos e apontar o dedo, ironicamente ou não, até
de brincadeira. Às vezes em nome da paz, inclusive. Precisamos chorar. Todos. Olhar
para nós mesmos. Aquele que não tem erros nisso tudo, atire a primeira pedra.
Nossos olhares estão plenos de perversidade, indistintamente. Nossas melhores
intenções se resumem a tirar algum proveito do momento e salvar a pele. E eu me
incluo. Nossa história comum carece de um final mais feliz, só possível, se
cada um olhar pra dentro de si e chorar. Chorar nossas mazelas. Talvez assim
possamos, todas e todos – retomo as marcações de gênero – chorar até com os que
choram. Há muita gente morrendo. E há muitos que até já cheiram mal.
Está na hora de encontrar recomeços pessoais, quiçá, coletivos. Quem sabe
possamos sair um após o outro, uma após a outra, em silêncio reverente, para
encontrar um espaço, onde, curvados sobre nós mesmos, contemplemos um deus-homem
escrevendo na areia.
Riquezas do oceano
Vi o documentário Professor Polvo (Netflix, 2020), dos diretores Pippa Ehrlich e James Reed, com produção de Craig Foster, um cineasta de vida selvagem, que também encena o filme ganhador do Oscar de melhor documentário em 2021. Trata-se do encontro do cineasta, antes de tudo, consigo mesmo. Ele transforma-se em pesquisador das riquezas dos oceanos, em meio aos mares e às concentrações de algas do Cabo das Tormentas, na África do Sul, onde encontra um polvo. A narração começa com os seguintes dizeres: “Muita gente diz que um polvo é como um alienígena. Mas o estranho é que, ao se aproximar dele, você percebe que somos parecidos em muitos aspectos”. E o filme narra essa aproximação, que implica em abrir-se ao diferente, vivenciando os prazeres e limites dessa aproximação. Antes dessa experiência, no entanto, o pesquisador filmante encontrava-se em um tempo de crise existencial, pessoal e relacional, envolvendo sua família e também seu filho em crescimento. A partir daí, pass...
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